Atila Iamarino - O biólogo de 36 anos é formado pela Universidade de São Paulo e fez doutorado e pós-doutorado na mesma universidade, com enfoque em microbiologia. Ele também fez pesquisas na Universidade de Yale, nos Estados Unidos, e já estudou vírus como ebola, Zika e HIV.
A participação de Átila Iamarino no ‘Roda Viva’ desta segunda-feira (29) trouxe um choque de realidade para muitas pessoas que ainda teimam em enxergar a pandemia do novo coronavírus como uma ameaça menor. De maneira bastante simples, o biólogo que bombou nas redes sociais em vídeos vistos por milhões de pessoas em questão de dias, deu o recado: “Para o mundo que a gente vivia não podemos mais voltar”.
Se você assistiu, com certeza teve dificuldades de dormir na noite que passou. Está tudo bem, sinal de que a fala do doutor em microbiologia de 35 anos te fez refletir. O conceito defendido pelo virologista se baseia em mudanças de postura que já podem ser percebidas, como a grande quantidade de pessoas trabalhando em casa ou a ajuda social de governos super capitalistas como dos Estados Unidos, que irá auxiliar para pessoas que vão perder seus empregos.
“A gente está descobrindo o que são os serviços essenciais, e estamos voltando a entender o valor de ciência, da mídia (profissional) e dos serviços de saúde. E de sistemas que são fundamentais desde sempre, mas que, em períodos de bonança, são fáceis de negligenciar. O sistema de saúde de vários países vai ter que ser reavaliado. Garanto para você que o sistema de saúde norte-americano vai ter um estresse maior que o do resto do mundo, inclusive pelo modelo (sem saúde pública universal) de tratamento que eles seguem”, disse Átila à BBC Brasil.
Questionado pela jornalista Vera Magalhães no ‘Roda Viva’ se as mudanças seriam imediatas, Átila ressaltou que tudo deve se apresentar de forma gradativa. E atenção, não são apenas notícias ruins.
“As pessoas vão mudar, hoje têm pais e mães convivendo mais com os filhos em casa, coisa que há 70 anos não se faz no país. Eu renovei o contato com todo mundo porque agora quero saber se meus pais estão bem, se meus sogros estão bem”, assinala.
A utopia de interromper o isolamento
O debate no Brasil está emperrado na defesa e ataque do distanciamento social. A discussão se dá sobretudo pela postura do presidente da República, que classificou a Covid-19 como uma ‘gripezinha’ e ameaçou reabrir escolas.
Átila, que por diversas vezes no ‘Roda Viva’ defendeu a imprensa e o trabalho da ciência, é bem direto em dizer que pensar em deixar o isolamento social agora é “tentar voltar a uma realidade que não existe mais”.
“Eu não acho que cabe nem discutir [isolamento vertical], porque ela não é uma proposta científica. Quando ela for, a gente pode ver quais são as condições”, enfatiza.
O Doutor em microbiologia pela Universidade de São Paulo (USP) faz uma análise entendível. Átila pontua que manter as pessoas dentro de casa é uma medida para evitar que o isolamento se perpetue por ainda mais tempo.
“Manter as medidas que a gente tem agora é o que vai fazer dar tempo para buscarmos outras medidas lá na frente. Na verdade, parar agora é ganhar o tempo para fazer escolhas”, explicou à BBC Brasil.
Os números parecem dar respaldo ao biólogo. O Governo do Estado de São Paulo divulgou que as medidas restritivas em vigor há pouco mais de uma semana retardaram o pico da doença. A defesa é de um estudo feito pelo Instituto Butantan, em parceria com o Centro de Contingência do Coronavírus de São Paulo e a UnB (Universidade de Brasília).
Antes da quarentena, a velocidade de transmissão do novo coronavírus era de uma pessoa para seis – que forçaria a disponibilização de 20 mil leitos à rede pública da capital paulista. Em 25 de março, já com a vigência da quarentena, a taxa caiu de uma para duas pessoas.
Embora veja com bons olhos o que vem sendo feito em São Paulo, Átila Iamarino alerta para a urgência da realização de mais testes. Só assim, diz ele, será possível ter uma ideia concreta da quantidade de infectados. Enquanto isso não é uma realidade, ele defende que todo mundo fique em casa.
Ciência para salvar vidas sem ideologia
Ao longo do ‘Roda Viva’, Átila procurou apresentar uma análise descolada do fanatismo ideológico que atrasa a luta do Brasil contra a pandemia e pode custar vidas. Enquanto atores políticos se digladiam, o vírus se acomoda nas entranhas do país.
“A gente está em uma casa pegando fogo. Hoje não importa se o governo é de esquerda ou de direita. Nós precisamos evitar que vidas sejam perdidas”, deu o tom.
E acrescentou, “hoje nós só temos um país que não está fazendo nada, que é a Bielorrússia. Nós vamos ver se quem está certo é um único país no mundo ou o que os estados brasileiros estão fazendo. Só lavar as mãos com vodka não adianta. Tem que ser com água e sabão”.
Átila Iamarino fez questão de enfatizar o trabalho da imprensa e da ciência. Sobre o campo científico, ele criticou o desmonte que segue no governo Jair Bolsonaro.
“O Brasil está parado uma fase de não investir na ciência nacional. Isso não é uma coisa de agora. É uma coisa que vem de longa data. Nós temos pessoas que estão preparadas para fazer testes, mas que descobriram recentemente que tiveram suas bolsas científicas”.