Um conjunto de matérias publicada nesta semana pelo jornal O Estado de São Paulo evidenciou uma situação calamitosa que a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino – Contee vem denunciando há muito tempo: a grande preocupação das instituições de educação superior com seus próprios lucros – engordados com recursos públicos oriundos do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e do Programa Universidade para Todos (ProUni) – em detrimento da qualidade do ensino ofertado e de condições de trabalho justas a seus professores e técnicos administrativos.

De acordo com a reportagem principal, assinada pelo jornalista José Roberto de Toledo, embora tenham visto, nos últimos anos, suas receitas subirem vertiginosamente, motivadas pelas fusões, pelas altas mensalidades e pelo crescimento do Fies, os grandes grupos educacionais com ações na bolsa de valores investem cada vez menos recursos na remuneração dos docentes. Segundo a matéria, a folha de pagamento de professores, que correspondia, em 2010, a 45% das receitas líquidas das empresas, caiu para 35% no ano passado.

Além da reportagem, a jornal traz outros dois textos: uma entrevista feita pela repórter Paula Saldaña com a presidenta da Associação Brasileira para o Desenvolvimento da Educação Superior (Abraes), Elizabeth Guedes – também vice-presidenta da Associação Nacional das Universidades Particulares (Anup) – e um artigo assinado por Roberto Lobo, ex-reitor da Universidade de São Paulo (USP). O primeiro, numa justificativa explicitamente falaciosa para a Contee e suas entidades filiadas – que conhecem de perto a realidade do ensino superior privado brasileiro –, argumenta que há gastos com professores, como qualificação, treinamento e capacitação, que não estão incluídos na rubrica contábil destinada aos docentes, e que, supostamente, a folha salarial estaria aumentando nos últimos anos. Já o segundo afirma que a redução de custos nessas instituições é perfeitamente justificável e que elas foram autorizadas a atuar porque as instituições públicas e as privadas sem fins lucrativos não davam conta de atender a demanda crescente do ensino superior.

Os trabalhadores que atuam no setor privado, categoria representada pela Contee e suas quase cem entidades filiadas, sabem, no entanto, qual é de fato a questão por trás dessa disparidade. E essa realidade conhecida por nós, aliás, está explícita numa das retrancas da matéria principal, assinada por Toledo, Saldaña e por Rodrigo Burgarelli: na verdade, a estratégia adotada por algumas instituições de ensino para reduzir gastos com professores passa pela substituição de docentes antigos (muitas vezes mestre e doutores) por novos, fechamento de salas, superlotação de turmas e redução do número de horas-aula dado por cada professor, substituindo-as por uma intensificação das atividades à distância.

O que está evidente é que os grandes grupos educacionais, além de todos os impulsos financeiros recebidos dos cofres públicos, estão ampliando seus lucros à custa da superexploração do trabalho docente. Esse cenário demonstra com ainda mais força a premente necessidade de intensificar a luta pela retomada da discussão, no Congresso Nacional, do Projeto de Lei 4.372/12 do Poder Executivo, que cria o Instituto Nacional de Supervisão e Avaliação da Educação Superior (Insaes), e em defesa de sua aprovação.

Isso porque um dos pontos do Insaes considerado fundamental pela Contee é o que estabelece a exigência, para credenciamento e recredenciamento de cursos, de que as IES estejam em regularidade perante as fazendas federal, estadual e municipal, a seguridade social, o fundo de garantia e a Justiça do Trabalho. Essa é uma medida imprescindível para combater não só a incorporação desmedida de instituições brasileiras de educação superior por grupos financeiros nacionais e internacionais como também a prática de, depois de adquiri-las, promover mudanças internas cuja finalidade é justamente reduzir despesas e maximizar lucros. É isso o que acarreta modificações em projetos pedagógicos de cursos que já passaram por avaliação, sobrecarga de professores e demissão de mestres e doutores e rebaixamento da formação dos estudantes e profissionais, em total despreocupação com um projeto de desenvolvimento para o país ou compromisso com uma educação de qualidade.

Brasília, 30 de julho de 2015.

Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino – Contee


Mais Lidas