A esperança de um país melhor; mais justo; com distribuição de renda e respeito aos direitos fundamentais da pessoa humana, se tornaram decepção e desapontamento para 47 milhões de brasileiros, quando foi anunciado o resultado da eleição presidencial no último dia 28 de outubro. A vitória do capitão reformado do exército Jair Bolsonaro, trouxe à metade do eleitorado que votou, a indignação e o medo pertencentes ao século passado, mais precisamente ao ano de 1964, quando ocorreu o golpe militar e marcou o início de 21 anos de ditadura no Brasil.

De acordo com o cientista político, professor da Unicamp e da Universidade de Sorbonne em Paris, Luiz Felipe de Alencastro, a vitória de Bolsonaro significa um enorme retrocesso ao País e às Américas. “É a primeira vez, desde o final do século 18, que a extrema-direita chega ao poder por meio do voto. Estamos numa situação inédita na história das Américas, uma situação que demanda muita vigilância e defesa dos direitos”, afirma.

Para Alencastro, há uma necessidade “óbvia” da criação de uma frente ampla democrática como contrapeso ao futuro governo de Bolsonaro, para tentar amenizar os efeitos maléficos que seu mandato causará ao Brasil. “Há um vazio político grande. Não só na esquerda, com a prisão de Lula, mas também com o desabamento dos partidos políticos de centro”, avaliou Alencastro.

O retrocesso no País deverá acontecer em todos os setores, com ideias avassaladoras que privilegiam interesses pessoais e do mercado de capitais, matando a fome dos empresários e de alguns segmentos internacionais. Para se chegar ao objetivo, o povo deverá ser severamente penalizado, começando com a reforma da previdência, como evidenciou o futuro ministro da Fazenda de Bolsonaro, Paulo Guedes.

O modelo proposto pelo governo de Bolsonaro é o do regime de capitalização da Previdência, o mesmo adotado no Chile em 1981 e que levou os idosos daquele país ao empobrecimento e a miséria. Atualmente o governo chileno pretende realizar uma nova reforma porque a situação dos idosos está insustentável, já que muitos não conseguiram se aposentar e a maioria dos que conseguiram, recebe quase metade do salário mínimo local.

Como é no Brasil?

No Brasil, o sistema de aposentadoria funciona por repartição, ou seja, os trabalhadores e as trabalhadoras com carteira assinada contribuem mensalmente com um fundo público que garante a aposentadoria, auxílios doença e acidente, pensão por morte e benefício assistencial. O trabalhador da ativa paga os benefícios de quem já está aposentado e quem pagará a sua, no futuro, é quem estiver trabalhando.

Como é o no Chile

No Chile, a reforma feita em 1981, durante a ditadura militar de Augusto Pinochet, adotou o sistema de capitalização da Previdência, no qual cada trabalhador ou trabalhadora faz a própria poupança, que é depositada em uma conta individual nas Administradoras de Fundos de Pensão (AFPs), que podem investir no mercado financeiro.

Os trabalhadores chilenos são obrigados a depositar ao menos 10% do salário por no mínimo 20 anos para se aposentar. A idade mínima para mulheres é 60 e para homens, 65. Não há contribuições dos empregadores nem do Estado.

Após 37 anos da implantação do modelo de capitalização, apenas metade dos trabalhadores e trabalhadoras chilenos conseguiram se aposentar. E como a maioria ganhava salários baixos, ficou grandes períodos desempregada ou não conseguiu fazer uma poupança com recursos suficientes, aproximadamente 91% dos aposentados recebem benefícios de cerca de meio salário mínimo do país, o equivalente a, em média, a R$ 694 – o piso nacional do Chile é de 288 pesos, ou R$ 1.575,66.

De acordo com o professor de economia da Unicamp, Eduardo Fagnani, “a implantação do modelo chileno no Brasil completaria o suicídio econômico e social em curso no Brasil, uma vez que a Previdência Social é um dos principais sistemas de distribuição de renda no nosso país”.

Segundo ele, 30 milhões de brasileiros recebem benefícios da Previdência Social, sendo que 70% recebem apenas um salário mínimo. “É um importante mecanismo de proteção social e que contribui para a queda da desigualdade social”, diz o economista, que explica, também, que o sistema chileno beneficia somente os fundos de pensão privada.

De acordo com o economista e supervisor do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Victor Pagani, a proposta que está sendo estudada pela equipe de governo de Bolsonaro, “ é mais ampla e profunda contra os trabalhadores; ela tem um impacto ainda maior sobre a seguridade e sobre a Previdência social pública que deve deixar a população idosa do País muito mais vulnerável ”, afirmou.

Segundo ele, tão grave quanto o ataque ao bolso do trabalhador é o caminho proposto pelo estudo , que para viabilizar a reforma pretende a retirada dos direitos previdenciários e da assistência social da Constituição. “Isso vai permitir que eventualmente, no futuro, sejam feitas outras alterações com mais facilidade, sem precisar aprovar uma nova PEC (Proposta de Emenda Constitucional)”, afirmou Vitor Pagani .

 


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