02/10/2023 – NOTA DA CONTEE, DO SINPRO ABC, DO SINPRO CAMPINAS E REGIÃO, DO SINPRO MINAS, DO SINPRO-JF, DO SINPRO-RIO E DA FESAAEMG SOBRE OS RUMOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL DA REDE METODISTA DE EDUCAÇÃO
Aos/às professores/as e administrativos/as,
credores/as da rede metodista de educação
Somos todos/as partícipes e/ou vitimados/as pelo longo e doloroso processo de recuperação judicial das instituições de ensino que integram esse grupo, que teve início formal aos 9 de abril de 2021, tendo o plano que a comprova sido aprovado, com nosso integral apoio, pela assembleia geral de credores/as, que teve lugar aos 22 de novembro de 2022.
Desde então, já se passaram mais de 10 meses. Nesse período, com apoio, empenho e mediação da Administradora Judicial, não temos economizado esforços para, a um só tempo, garantir o cumprimento de todas as obrigações do plano de recuperação judicial (PRJ) e viabilizar o soerguimento das instituições, inclusive com reuniões semanais, fazendo-o mesmo conscientes das hercúleas dificuldades para este último mister. O que, aliás, apontávamos aos primeiros passos da recuperação.
É bom que se patenteie, de forma insuscetível de dúvidas, que votamos pela aprovação do PRJ, tão somente, como moratória para quitação dos créditos trabalhistas já constituídos e inadimplidos, sem deságio e com aval da AIM — Associação das Igrejas Metodistas; e nada mais.
Patenteie-se, ainda, por ser oportuno, que não concedemos nem concederemos jamais salvo conduto para subtração de direitos extraconcursais (relativos ao período posterior a 29 de abril de 2021, data do processamento do pedido de recuperação), para sistemático atraso no pagamento dos salários, para sonegação de verbas rescisórias e para protelação de depósitos do FGTS, o que tem sido a marca do período que se sucede à aprovação do PRJ.
Desafortunadamente, a crônica da anunciada insustentabilidade financeira das instituições e da impossibilidade de seu soerguimento fica a cada dia mais palpável, para não dizer irreversível. Para comprovar essa assertiva, basta que tomemos alguns números constantes dos relatórios da AJ e daqueles emitidos pelas próprias instituições “recuperandas”.
Ao início do processo de recuperação, abril de 2021, os créditos trabalhistas concursais reconhecidos, ou seja, incluídos no PRJ, eram da ordem de R$ 309 milhões. Segundo o 23º relatório da AJ, os créditos extraconcursais inadimplidos (não pagos), que, repita-se, são devidos em datas posteriores ao dia 29 de abril de 2021, já chegaram à estratosférica cifra de R$ 318 milhões.
Por essa e outras razões, o prejuízo financeiro acumulado de abril de 2021 até a data do citado relatório — mês de junho de 2023 — totaliza R$ 396 milhões. A dívida tributária total das recuperandas soma aproximadamente R$ 580,7 milhões, não havendo regularidade fiscal, visto que existe em atraso o montante aproximado de R$ 378,1 milhões.
Importa dizer: é cada vez menor a fresta de luz ao fim do túnel quanto à possibilidade de soerguimento das instituições.
Como se não bastasse o quadro de descalabro acima anotado, a partir de 29 de abril de 2021 até junho último, foram efetivadas mais de 1.150 rescisões contratuais, sem a correspondente quitação das verbas rescisórias. Algumas centenas delas, objeto de parcelamentos — a par de sua ilegalidade —, se encontram inadimplidas há meses. Isso sem contar as quase três centenas delas que não se acham no quadro de ilegal parcelamento e nem de reclamação trabalhista, situando-se no que temos chamado de limbo, e que montam mais de R$ 13 milhões, segundo os relatórios semanais encaminhados pela própria RME às entidades sindicais e à Administradora Judicial.
As parcelas de FGTS dos funcionários em atividade ainda se encontram inadimplidas há dezenas de meses. Até mensalidades associativas devidas aos sindicatos, descontadas dos contracheques dos trabalhadores, não são repassadas, o que, em tese, encontra tipificação penal no crime de apropriação indébita, além de avolumar o crédito devido aos sindicatos.
A distorção entre docentes e administrativos é surreal. Segundo as informações obtidas nas reuniões periódicas mantidas com a administradora judicial e os sindicatos, no final do semestre passado (junho/2023) tinha-se a seguinte (des)proporção: do total de pouco mais de 2.000 contratos ativos, apenas 812 eram docentes, quando, já com muito exagero, deveria ser no mínimo o inverso, como se colhe dos dados do censo escolar e das orientações das entidades patronais de grau superior.
Além de tudo, não se pode descurar que já se chegou quase à metade do período de supervisão judicial e as expectativas de cumprimento do plano de recuperação judicial se dissipam a cada dia, enquanto as de soerguimento das atividades educacionais despencam em queda livre.
Inobstante nossa paciência, a cooperação para além do que é esperado e da fiel observância dos princípios da probidade e boa-fé, a reciprocidade quanto a esses princípios parece não ser a tônica que se desenvolve no âmbito da administração das recuperandas, facilmente demonstrada a partir de sua conduta — ao arrepio de prestar qualquer informação ou esclarecimento às entidades sindicais, semanalmente reunidas — em descumprir a forma ordinária de pagamento prevista no plano de recuperação judicial, ou seja, de promover o pagamento dos créditos concursais mediante simples transferência bancária para conta indicada e titularizada pelo credor, valendo-se do expediente generalizado e burocrático de se promover o depósito judicial vinculado a processos trabalhistas, a pretexto de que teriam obtido autorização irrestrita do juízo da recuperação judicial — o que não passa de meia verdade, pois a autorização judicial, ao nosso entender, teria sido concedida apenas para a quitação dos créditos de quem não forneceu dados bancários atualizados.
Em mais uma incontestável prova de menos cabo dos princípios da cooperação, da probidade e da boa-fé, as recuperandas, no evento N. 8456 do processo, protocolaram petição, travestida de “processo de reorganização”, para obtenção de DIP[1], no valor de R$ 150 milhões, mas que, a rigor, nada mais faz do que revelar atentado contra a boa-fé e possível fraude contra os/as credores/as, conforme aduzido em nossa manifestação judicial, evento N. 8489 dos autos, que pode ser lida em seu inteiro teor, clicando aqui.
Frise-se que as condições para constituição das garantias para tal DIP revelam-se intoleráveis, especialmente considerando absurdo “LTV” (loan to value = valor do empréstimo), que tem o patamar máximo de 35% do valor da garantia. Como explicitado pelas recuperandas, “para liberação do valor de R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões) é necessário uma garantia de R$ 143.000.000,00 (cento e quarenta e três milhões), portanto, os ativos indicados serão constituídos como garantia até o limite exigido”. Em leitura simples, significa que, para cada tranche de R$ 50 milhões, será exigida uma garantia sobre imóveis de, praticamente, 3 (três) vezes o valor do empréstimo, o que impõe às recuperandas, para que se alcance o financiamento de R$150 milhões, a constituição de garantias imobiliárias equivalentes a R$450 milhões!
E não é só! O item 15 do “Resumo das Características do Financiamento DIP BMI” impõe, ainda, para além das abusivas garantias imobiliárias, também como condição precedente, que todas as Associações das Igrejas Metodistas sejam “avalistas” do financiamento DIP, colocando em risco também o sistema de proteção e garantia de pagamento dos créditos concursais trabalhistas que foram alcançados e constituídos no Plano de Recuperação Judicial, sem o qual, repita-se, não haveria mínima condição de aprovação pelos credores da classe I.
Também sob o aspecto econômico, é de se questionar o financiamento DIP, que, para além dos elevadíssimos juros remuneratórios (CDI, este acumulado em 2023 em 13,15%, mais o equivalente a 17% a.a.), se encontram superiores à taxa média do Banco Central para operações de mesma natureza, especialmente considerando a garantia por alienação fiduciária[2].
Destarte, sem embargo do pleno conhecimento da inadiável necessidade de obtenção do financiamento DIP para prosseguimento das atividades desenvolvidas pelas reclamadas, reafirmamos, como já o fizemos nos autos do processo de recuperação, nossa intransigente e irrevogável oposição aos meios e as formas com que se pretende estabelecer o aludido financiamento.
Dispomo-nos, se for o caso — esperando que não o seja —, a adotar todas as medidas administrativas e judiciais que se apresentarem como imprescindíveis à preservação integral dos créditos trabalhistas, concursais e extraconcursais, passados, presentes e futuros, nelas incluído o pedido de falência.
Atenciosamente,
Contee — Sinpro Campinas e Região — Sinpro ABC — Sinpro Minas —
Sinpro-JF — Sinpro-Rio — Fesaaemg
[1] Debtor in possession financing (DIP), expressão inglesa com tradução literal “financiamento do devedor na posse”,
modalidade de financiamento para empresas em recuperação judicial prevista no art. 69-A da Lei 11.101/05.
[2] Espécie de contrato em que o não pagamento implica a transferência da posse e da propriedade do bem da em garantia ao financiador.