De acordo com especialistas na área da educação, o ensino médio é o principal gargalo do sistema educacional brasileiro. No País esta fase reúne pouco mais de oito milhões de matriculados. No entanto, 15% dos jovens entre 15 a 19 anos, nem chegam a ingressar no ensino médio. Dos que se matriculam, metade abandona a escola.

Além desses números alarmantes, outra constatação preocupa o setor: o atual currículo não prepara os estudantes nem para o mercado de trabalho, conforme estabelecido na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, nem para o ingresso na educação superior. Quase 10 milhões de jovens na faixa etária de 15 a 24 anos (ou seja, um quinto dessa população) não estudam e nem trabalham.

De acordo com Madalena Guasco Peixoto, coordenadora geral da CONTEE, Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimento de Ensino, “Na história da educação brasileira existe uma dicotomia não solucionada entre o ensino propedêutico e o ensino profissionalizante. Todas as reformas anteriores não conseguiram resolver essa questão, além disso os parâmetros curriculares da educação média encontram-se defasados”.

Para ela, adequar o currículo não é tarefa simples, porque não existe uma única concepção sobre a formação em nível médio. “ De fato hoje se faz necessário restabelecer a relação entre o ensino geral das ciências e das humanidades com a formação para o trabalho , que não deve ser o simplificado ensino de habilidades”, afirma.

Projeto de Lei 6840/13

Um projeto está em discussão na Câmara dos deputados e quer adaptar o ensino médio às necessidades do jovem brasileiro. A principal mudança prevista no Projeto de Lei 6840/13 é que os alunos poderão direcionar, já no ensino médio, o currículo de acordo com quatro áreas do conhecimento: linguagens, matemática e ciências da natureza, ciências humanas e formação profissional. O projeto foi aprovado por uma comissão especial no fim do ano passado, e agora será analisado pelo Plenário da Câmara.

A proposta quer mudar a forma como é transmitido o conhecimento para os jovens, garantindo mais conteúdo focado diretamente nos interesses de cada aluno. O texto prevê que nos próximos dez anos o ensino integral esteja disponível em metade das escolas, para um quarto dos alunos brasileiros. Todos continuarão sendo obrigados a cumprir as 12 disciplinas básicas do currículo.

Segundo Madalena Guasco, este projeto de lei tem dois problemas:

1 “divide conhecimentos fundamentais para qualquer jovem em áreas optativas de conhecimento. Durante a década de 30 foi feita a mesma coisa com a reforma Capanema e não deu certo, e durante a ditadura militar novamente se tentou uma divisão parecida e também não deu certo”.

2- “coloca a educação profissional sem especificar o que se entende por educação profissional. Esse tipo de relação entre o ensino propedêutico e o profissional somente tem sentido quando o ensino da profissão está conectado ao ensino sobre o mundo do trabalho, e sobre as necessidades regionais e nacionais de formação para o trabalho. Não deve ser entendido como o ensino de uma profissão(elemento em constante mudança no mundo de hoje) e caso o PL 6840 venha ser aprovado, seria um retrocesso para a educação no País”.

A coordenadora geral da CONTEE defende a ideia de um ensino unificado, “Temos que ter um currículo nacional que de conta de transmitir o conhecimento produzido pela humanidade em todas as áreas de formação conectada, inter-relacionada e atualizada não só as novas linguagens como as novas necessidades colocadas pela produção da cultura e do mundo do trabalho no século XXI. Mas esse currículo também pode ser ampliado a partir dos interesses dos alunos e das necessidades especificas regionais”.

Já o presidente da comissão especial que analisou o projeto, deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), defende as vantagens de um sistema que vai aliar um currículo básico nacional com áreas temáticas de conhecimento. “A ampliação de carga e a flexibilidade do currículo darão ao aluno o protagonismo de escolher o que ele quer estudar mais.”

Barreiras

Reginaldo Lopes admite que o projeto enfrenta duas grandes barreiras: a falta de espaço físico e de formação dos professores. Ele acredita, no entanto, que o estudo por área de conhecimento já é um grande avanço. “Tem que dar tempo para construir escolas maiores, modernas, com biblioteca, sala multimídia, anfiteatro. E isso é um processo”, diz.

Já de acordo com Madalena Guasco, “além dos problemas físicos da escola é preciso também que o PL se adeque as metas do PNE. O Projeto de Lei propõe sem a mínima analise de realidade o ensino integral para todos matriculados no ensino médio e também a proibição da educação noturna para jovens com menos de 18 anos, esse tipo de proposta chega a ser inconsequente quando não se propõe atendimento global ao aluno , com bolsa de estudos inclusive”.  

De acordo com o PL outro ponto questionado é com relação à formação dos professores com alterações nos cursos de licenciaturas que também passarão a ser divididos por área. A coordenadora geral da CONTEE avalia que “é muito difícil entender que o ensino hoje de geografia , ou de física não está sendo atraente para os estudantes porque eles não optaram por estudar esses conhecimentos , ao meu modo de ver , se esses conhecimentos não estão sendo empolgantes os motivos não estão na opção por área , mas nos métodos pedagógicos ultrapassados , na falta de participação efetiva dos estudantes na organização dos currículos, na desvinculação dos conteúdos à realidade cultural, como tecnológica e do mundo do trabalho”.    

Remuneração

Por último, mas não menos importante, a qualidade do ensino passa pelo salário do professor como destaca José Carlos Oliveira Costa, diretor do SINPRO ABC, “pode-se afirmar que sem um docente bem remunerado, com boa formação e uma sociedade valorizando e controlando socialmente a qualidade da escola - com princípios, missão e diretrizes democráticas-, e ainda, as universidades colaborando e exigindo padrões mínimos de aprendizagem, dificilmente nosso Ensino Médio superará seus problemas históricos, sobretudo, elevar o número de concluintes, evitar a evasão escolar e adequar o estudante na sua próxima etapa formativa ou de vida.”

Mas a reforma do ensino médio ainda tem um longo caminho a percorrer. De acordo com informações da assessoria de imprensa da Câmara dos deputados, o projeto está pronto para ser discutido e votado na casa e se aprovado será encaminhado ao Senado para apreciação, pareceres e votação. Caso seja aprovado também pelo senado vai para sanção da presidenta da República.


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