Por José Geraldo de Santana Oliveira*

Em meio à tormenta de cotidianas notícias danosas aos trabalhadores, surge uma de longo alcance social para os professores aos quais — e são muitos — é imposta a nomenclatura “instrutor”, com a finalidade de lhes suprimir os direitos inerentes à categoria, assegurados pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) — Arts. 317 a 322 —, e por acordos e convenções coletivas de trabalho.

A 1ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST), no julgamento do Processo N. TST-RR-515-18.2013.5.04.0010, com Acórdão publicado no dia 28 de outubro último, decidiu que o enquadramento como professor independe de habilitação legal e da nomenclatura dada ao contrato de trabalho; o que importa é o exercício da função docente, como determina o Princípio da Primazia da Realidade.

Transcreve-se, aqui, para dar a exata dimensão da referida decisão, a Ementa do Acórdão que a consagrou:

PROCESSO Nº TST-RR-515-18.2013.5.04.0010

“RECURSO DE REVISTA. LEI N.º 13.015/2014. INSTRUTORA DE INGLÊS. ENQUADRAMENTO SINDICAL. APLICAÇÃO DAS NORMAS COLETIVAS DA CATEGORIA DOS PROFESSORES. PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DA REALIDADE. 1. O Direito do Trabalho norteia-se pelo princípio da primazia da realidade, sobrepondo-se os fatos à forma. 2. Em homenagem a tal princípio informador do Direito Trabalhista, a jurisprudência desta Corte uniformizadora tem-se firmado no sentido de que a não satisfação das exigências insertas no artigo 317 da CLT – quais sejam: habilitação técnica legalmente estabelecida e registro no Ministério da Educação – não obstaculiza o enquadramento sindical de empregado contratado como instrutor de idiomas na categoria dos professores. 3. Precedentes. 4. Recurso de Revista conhecido e provido”.

*José Geraldo de Santana Oliveira é consultor jurídico da Contee

O Núcleo de Estudos e Pesquisas da Consultoria Legislativa publicou, na manhã desta segunda-feira (7), um o documento "As inconstitucionalidades do ‘Novo Regime Fiscal’ instituído pela PEC 55, de 2016 (PEC 241 de 2016, na Câmara dos Deputados)”. O texto aponta inconsistências e ilegalidades contidas na “PEC da morte”, como ficou conhecido.

Segundo o texto do estudo, "a PEC nº 55, de 2016, tende a abolir as cláusulas pétreas previstas nos incisos II, III e IV do § 4º do art. 60 da Constituição Federal, que se referem, respectivamente, ao voto direto, secreto, universal e periódico; à separação de Poderes e aos direitos e garantias individuais, razão pela qual deve ter sua tramitação interrompida no âmbito das Casas do Congresso Nacional.”

Após passar pela Câmara dos Deputados em votação de dois turnos, a PEC 55 está tramitando no Senado. Se aprovado o texto, o Brasil congelará por 20 anos os investimentos públicos.

Dessa forma, setores como Saúde e Educação sofrerão as consequências da medida, já que os reajustes para repasse de verbas serão feitos de acordo com a inflação.

Durante o os governos dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, os reajustes eram feitos acima da inflação.

 

O jurista Pedro Paulo Manus, ex-ministro do Tribunal Superior do Trabalho e diretor da faculdade de Direito da PUC/SP, afirmou em entrevista à TV Fepesp que liminar concedida pelo ministro Gilmar Mendes, do STF, “provoca de imediato uma fragilização da posição dos trabalhadores” em negociações coletivas. Em 14 de outubro, em uma medida cautelar, o ministro Gilmar Mendes cassou a possibilidade de que acordos coletivos pudessem ter suas cláusulas sociais mantidas enquanto durasse a negociação entre as partes e mesmo depois de superada a data base das categoria. Essa possibilidade era garantida, até então, por uma decisão do Tribunal Superior do Trabalho de 2012, a súmula 277 do TST. Agora, Agora, ao final de um período de acordo ou convenção coletiva de trabalho, volta tudo à estaca zero e direitos antes assegurados serão revogados.

 “Estamos esticando muito a corda entre empregados e empregadores e uma hora  ela vai estourar” disse Manus. “E nós já sabemos para que lado que o prejuízo é maior”.

 O ex-ministro Manus fez estas declarações no programa ‘Sala de Professores’, produção da Federação dos Professores do Estado de São Paulo. O debate sobre o risco agora imposto aos acordos coletivos de trabalho foi conduzido por Celso Napolitano, presidente da Fepesp, com a participação do diretor sindicato dos professores em Sorocaba, Fabio Luís Pereira, também diretor de assuntos Jurídicos e Previdenciários da Federação.

 “O direito do trabalho surgiu do reconhecimento da sociedade de que o Estado tinha que intervir nas relações do trabalho para poder equilibrar a balança entre o empregado e o empregador”, disse Manus. A medida cautelar de Gilmar Mendes “pegou de surpresa os trabalhadores” e, com isso, desequilibrou as relações de trabalho. O ex-ministro afirmou ainda que uma solução alternativa à extinção da súmula 277 seria alterar sua redação para deixar claro, e de forma antecipada, que as cláusulas sociais em acordos coletivos sejam agregadas aos contratos de trabalho e sejam passíveis de negociação em campanhas futuras, resolvendo assim uma possível expectativa do setor patronal com uma data de encerramento de acordos negociados.

 Manus ainda reconheceu que essa alteração é especialmente prejudicial aos professores da rede privada em São Paulo, que tem sua data base em 1° de março e que, durante o período de negociações, em janeiro e fevereiro, encontra-se em férias ou recesso, dificultando sua mobilização por um novo acordo. 

 Manus era ministro do TST quando esse Tribunal atualizou a sua  súmula 277 para garantir que os acordos e convenções seguissem em vigor até o final da negociação, o que passou a ser chamado de ‘ultratividade da norma coletiva’. “A partir dessa mudança, se o empregador não concordasse com o dissídio coletivo prevaleceriam as cláusulas já ajustadas até então. Nesse caso, o empregador tinha interesse em discutir o porquê das cláusulas no processo de negociação”, disse. Agora, segundo o diretor do Sinpro Sorocaba Fabio Luis Pereira, “foi eliminado o poder de barganha da categoria”.

 “Nosso trabalho pré-campanha vai impactar muito no resultado da campanha salarial”, afirmou Fabio Luis. “Quanto mais a categoria tiver a consciência e a noção da pressão que ela pode fazer melhor será”, disse.

 O programa ‘Sala de Professores’ é uma produção semanal da Federação dos Professores do Estado de São Paulo. Em São Paulo (capital) o programa vai ao ar no Canal Universitário NET canal 11, VIVO canais 10 ou 187), e também no canal da TV Fepesp no YouTube (aqui: http://bit.ly/2fjG4VT).

Educação e PEC241: retrocesso de mais de 80 anos

Por Laura Carvalho. Artigo publicado originalmente no site Outras Palavras *

 Garantia de percentual dos impostos para ensino foi estabelecida pela Constituinte de 1934. Sabia-se que país precisa superar atraso e desigualdade. Isso pode ir por água abaixo

 No Brasil, a vinculação de recursos tributários para a educação pública teve origem na Constituição de 1934. A ideia que fundamenta a vinculação é de que, para garantir direitos aos cidadãos, é necessário atribuir deveres ao poder público. O artigo 112 da Constituição de 1988 define que a União nunca aplicará menos de 18% da arrecadação de impostos na “manutenção e desenvolvimento do ensino”. Em 2000, o mesmo princípio foi estendido para saúde, que inicialmente acompanhava o crescimento do PIB e, a partir de 2016, passou a estar associada à evolução da arrecadação total.

 A exposição de motivos da PEC 241 diz a que veio: “(…) É essencial alterarmos a regra de fixação do gasto mínimo em algumas áreas. Isso porque a Constituição estabelece que as despesas com saúde e educação devem ter um piso, fixado como proporção da receita fiscal”. Em um governo aberto ao debate democrático, a PEC do “teto de gastos” deveria chamar-se PEC da “desvinculação de recursos”.

 Sob a alegação de que despesas obrigatórias engessam o Orçamento, a emenda altera o mínimo destinado a essas áreas para o valor vigente quando da implementação da regra, ajustando-o apenas pela inflação do ano anterior. Hoje a União gasta com saúde e educação mais do que o mínimo constitucional. Se em 2017 a União se ativer a esse mínimo, tal valor real passaria a funcionar como piso constitucional por 20 anos, mesmo em caso de expansão da arrecadação.

 O governo alega que trata-se de um mínimo, e não de um teto, o que não implicaria necessariamente em um congelamento real dos recursos destinados a essas áreas. No entanto, dada a previsão de crescimento dos gastos com benefícios previdenciários —que ocorrerá por muitos anos mesmo se aprovada a reforma da Previdência—, o teto global para as despesas de cada Poder tornaria inviável a aplicação de um maior volume de recursos nas áreas de saúde e educação públicas. Caso contrário, despesas com outras áreas —cultura, ciência e tecnologia, investimentos em infraestrutura ou assistência social, por exemplo— teriam de ser ainda mais comprimidas ou até mesmo eliminadas.

 Na prática, isso significa o abandono do princípio básico que norteou essas vinculações desde 1934, qual seja, de que enquanto não chegarmos aos níveis adequados de qualidade na provisão de educação e saúde públicas, eventuais aumentos na receita com impostos devem ter uma parcela mínima destinada à provisão destes serviços.

 Embora haja sempre alguma margem para aumento na qualidade dos serviços pela maior eficiência —sem elevação de despesas—, a evidência é que houve melhora nos indicadores de resultado de ambas as áreas com a destinação maior de recursos na última década.

Ainda assim, os gastos em educação e saúde per capita no Brasil se mantêm em níveis muito abaixo da média dos países da OCDE. Com o crescimento populacional nos próximos 20 anos, o congelamento implicará em uma queda vertiginosa nesses indicadores. O envelhecimento da população, em particular, reduzirá muito as despesas com saúde por idoso, com consequências dramáticas sobre os mais vulneráveis.

 Na contramão de países como Chile e EUA, que hoje caminham na direção de uma ampliação da gratuidade na provisão desses serviços, a proposta disfarça a desistência de levar o Brasil aos níveis de qualidade de ensino e atendimento em saúde públicos das economias mais avançadas. Em um país com níveis altíssimos de desigualdade social, não é difícil perceber as implicações.

*Laura Carvalho é professora do Departamento de Economia da FEA-USP com doutorado na New School for Social Research (NYC)

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